Quase nada sabemos sobre os reis das três primeiras dinastias, sucessores de NARMER, muito menos ainda sobre a nobreza e praticamente nada do povo.
Na realidade era impossível que o faraó pudesse desempenhar todas as funções oficiais e rituais de todo o país.
Tinha, pois, que transmitir obrigações a simples homens mortais, encarregando-os de atuar pelo rei, em seu nome.
Na organização ministerial, Faraó estava sobre os ministros, eles sobre os governadores provinciais e estes, finalmente sobre os alcaides das aldeias.
Não encontramos nos manuscritos egípcios palavras que designem "governo", "Estado" e "Nação".
Havia somente expressões geográficas como
'a terra',
'a terra negra',
'as Duas Terras', e palavras referidas a Faraó : 'realeza', 'domínio'.
A maior parte dos nobres administradores usavam títulos, expressando sua responsabilidade :
'Inspetor do Palácio' ,
'Inspetor de todas as obras do Rei' ,
'Porta-Selos do Rei do Baixo Egito' ... este último título manifestava a autoridade de certos funcionários para dirigir os negócios longe do rei e da capital, certificando suas transações com a chancela real.
No principio, só o filho do rei podia ter esse cargo ; depois, generalizou-se.
Os comissários que se enviavam ao 'Cuxe' (= Sudão) tinham que atuar com independência de juízo, mas expressavam a convicção de que agiam sob as ordens de Faraó.
A burocracia parece ter sido pequena na primeira parte do Antigo Império, sendo possível uma "intimidade" maior com Faraó.
Entretanto existem provas de que sua divina pessoa era intocável e ninguém podia acercar-se dela.
Na V Dinastia somente o vizir era o 'Porta-selos do Rei do Baixo Egito', com autoridade de vigiar o movimento de exportação e importação.
No fim da VI Dinastia já encontramos dezenas de porta-selos.
O mesmo ocorreu com o 'Governador do Alto Egito'.
No Primeiro Período Intermediário, o governo foi reclamado por vários pretendentes e os governadores fomentavam independências locais.
Os faraós, em seus desejos de estabelecer e estender o Estado, alimentaram o individualismo e a autoconfiança de seus nobres, tendo agora que buscar o apoio e aliança de muitos deles para se manterem no trono.
Após o Domínio Hikso, os funcionários mais altos do país, sob a supremacia do faraó, eram o
'Grande Sacerdote de AMEN' em Karnak,
o 'Vizir do Baixo Egito' e
o 'Filho do Rei de Cuxe' (= vice-rei da Etiópia) : este cargo tinha a responsabilidade de mais duas funções : além do governo do Império Africano, o comando do exército da África e a exploração das minas de ouro da Núbia.
Tais encargos serviam de aprendizagem e preparação ao príncipe herdeiro - uma função demasiadamente pomposa e diplomática.
Vizir Ramose, Governador de Tebas e esposa. Alto relevo de sua tumba. |
Um outro cargo de grande responsabilidade, devendo inspirar respeito imediato e indiscutível, era o de 'tjate' (= homem) : vizir.
'Inspira medo de ti para que os homens o temam.
O funcionário real é um funcionário que atemoriza os homens.
O próprio temor ao funcionário é que fará a Justiça'.
O necessário seria uma mescla adequada de simpatia e autoridade.
Sem dúvida o cargo de 'Vizir do Alto Egito' era muito mais importante do que a de seu companheiro, o 'Vizir do Baixo Egito'.
Primeiramente, porque essa função estava associada com a do governador da capital, Tebas.
E, automaticamente, quando Faraó se ausentava para a Ásia ou para o Cuxe, ele se tornava o primeiro-ministro ou 'Rabisîr', regendo todo o país.
Recentes descobertas na região de Tebas : tumbas de nobres egípcios. |
O túmulo de REKHMARA (nº 100, de Biban-el-Moluk) é o mais completo documento sobre o assunto, pois esclarece seus poderes e deveres.
SETHE e WEILL publicaram duas obras sobre a personagem do vizir, intituladas "Die Einsetzung des Veziers" e "Die Veziere des Pharaonreiches" - Strasbourg, 1908.
Um outro oficial fiscalizava os vizires na ausência do rei :
'Os Dois Olhos do Rei', no Baixo Egito e
'Os Dois Ouvidos do Rei', no Alto Egito.
'Vigia os escritórios do vizir ; sê atento a tudo que aí se passa.
Toma cuidado para que eles sejam a armadura de todo o país...
O cargo de vizir não é uma coisa suave e sim amarga...
Imagina que ele não tem por única missão respeitar os príncipes e os conselheiros ; que não deve escravizar as populações...
Quando um peticionário chega do Alto ou Baixo Egito... toma cuidado para que tudo se passe conforme a Lei, que o costume seja observado e que o direito de cada um seja respeitado...
É uma abominação demonstrar parcialidade...
Olha para aquele que conheces da mesma maneira que o que não conheces e o que está próximo do rei do mesmo modo do que está longe.
Pensa bem que o príncipe que se comporta assim permanecerá longamente em seu cargo.'
Os vizires possuíam outros títulos:
'Grão-Sacerdote de AMEN' ( usado por HAPU-SENEB ),
'Grão-Sacerdote de PTAH em Mênfis' ( por PTAH-MOSIS ),
'Conde de Tinis e dos Oásis' , El Karga e Dakhba ( por REKHMARA ) e
'Senhor Eminente sobre Todos'.
Só o favorito da HATSCHEPSUT, seu amante SEN-MUT, colecionou todos estes :
'Príncipe e Conde Hereditário' ,
'Porta-Selos do Reis do Baixo Egito' ,
'Companheiro Único' ,
'Grão-Mordomo de AMEN' ,
'Superintendente dos Campos, dos Jardins, das Vacas, dos Lavradores e dos Servidores de AMEN' ,
'Grande Profeta de MENTOU em Hermontis' ,
'Profeta da Barca Sagrada de AMEN',
'Portavóz do Santuário de GEB' ,
'Chefe da Casa da Coroa Branca' ,
'Interventor da Grande Sala da Casa dos Funcionários',
'Grão-Mordomo do Rei' ,
'Superintendente da Residência Real' ,
'Tutor da Princesa NEFRU-RE' ,
'Tutor-Pai da Princesa NEFRU-RE',
'Interventor de todas as Obras do Rei em Karnak, Hermontis, Deir-el-Bahari, Templo de MENTOU, Karnak e Luxor' ,
'Superintendente dos Superintendentes das Obras'
( J.A.WILSON - "The Burden on Egypt" ).
O vizir tinha a função de informar diária e diretamente a Faraó, o primeiro magistrado do país, sobre
as contribuições do Egito,
os tributos estrangeiros,
o andamento das obras públicas,
construções de barcos,
condições do Nilo,
armazenamento de provisões,
censo anual dos animais,
confirmar o andamento dos processos dos governadores ; sua responsabilidade, portanto, era enorme.
Tudo era-lhe encaminhado, com excessão do tesouro, cargo do 'Tesoureiro do Rei'.
Um outro encargo de não menor importância era o de chanceler.
Como 'Diretor dos Seleiros', era o responsável pelo sistema econômico, compra e venda de mantimentos do reino.
Ele determinava a taxa, fiscalizava a coleta, controlava as finanças dos templos.
Recebia do vizir o seu relatório diário, para submetê-lo a Faraó.
Os nomarcas constituíam a aristocracia provincial.
O nomarca era o líder material e espiritual de sua pequena comarca ou nomo.
Era o administrador, o juiz e o sumo-sacerdote do culto local.
À sua volta uma pequena côrte se movimentava.
Artistas e artesãos preparavam-lhes os túmulos e as estátuas.
Em várias ocasiões esses "barões" do poder prestaram ao Egito relevantes serviços, como no caso do Médio Império : um pequeno grupo de nomarcas do Alto Egito, iniciaram e terminaram a luta com usurpadores asiáticos.
Sob o Novo Império sempre se mostraram satisfeitos com as guerras de seus senhores tebanos, abolindo o conceito de individualismo político.
Seu ofício sempre foi respeitado até o fim da era dinástica.
Nas cidades governadas por um descendente de príncipes locais, encontramos o 'uohen' = delegado real ou fiscalizador.
KLAUS BAER, em seu livro "Rank and Title in the Old Kingdon", contou em diferentes túmulos das XV e XVI Dinastias mais de 1.800 títulos variados.
Completamos nossa lista com os demais :
'Leitor Sacerdote e Conselheiro dos Comandantes Gerais' ,
'Inspetor do Banho Duplo' ,
'Comandante do Banho' ,
'Porta-Sandálias do Rei' ,
'Único Amigo' (= título de HERKUFE) ,
'Tesoureiro do Rei do Baixo Egito' ,
'Guarda das Coisas que Chegam' ,
'Zelador do Tesouro' ,
'Escriba do Rei' ,
'Senhor Secreto da Casa Real' ,
'Senhor Secreto de todas as Palavras do Rei' ,
'Diretor das Roupas Reais' ,
'Servo das Mãos' ,
'Mestre das Oferendas' ,
'Diretor dos Óleos e Unguentos' ,
'Guarda das Perucas Reais' ,
'Diretor Geral do Tesouro' ,
'Copeiro Real' ,
'Principal Artífice do Rei' ,
'Chefe-Escriba de AMEN' ,
'Kher-heb' (= mestre das cerimônias ) ,
'Inspetor do Harém' ,
'Grande Médico do Rei' ,
'Guardião da Cabeça' ,
'Guardião de Boca' ,
'Supervisor do Celeiro' , e muitos outros.
Os camareiros e os mordomos eram os mais chegados a Faraó e o acompanhavam em suas conquistas e excursões.
Os tesoureiros não eram fiscalizados por ninguém, sendo responsáveis apenas perante o rei.
As inscrições dos túmulos nada atestam sobre atritos entre os departamentos de Estado.
Uma das grandes distrações era o jogar 'senet' (damas ?) |
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